29 de mar. de 2009

PARABÉNS À CIDADE DE SALVADOR

De uma das filhas D'Oxum...


Nessa cidade todo mundo é d'Oxum
Homem, menino, menina, mulher
Toda essa gente irradia magia
Presente na água doce
Presente na água salgada e toda cidade brilha...
Presente na água doce
Presente na água salgada e toda cidade brilha...
Seja tenente ou filho de pescador
Ou importante desembargador
Se der presente é tudo uma coisa só
A força que mora n'água
Nao faz distinção de cor
E toda cidade é d'Oxum...

É d'Oxum, é d'Oxum ô, é d'Oxum
Eu vou navegar
Eu vou navegar nas ondas do mar eu vou navegar,
Eu vou navegar
É d'Oxum...

22 de mar. de 2009

LEMBRANÇA - DOIS POEMINHAS DE AMOR

TEREZA
Manuel Bandeira

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna
Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)
Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.

AMAR
Carlos Drummond Andrade

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

5 de mar. de 2009

O PARAÍSO COMO PRÊMIO

Nas vésperas do dia alusivo à Luta das Mulheres, o 8 de março, nos deparamos com os noticiários expondo recentes exemplos da dura realidade da violência contra as mulheres no Brasil, com um agravante considerável: essas mulheres violentadas são apenas meninas.
Isso já seria demais para as nossas cabeças feministas (e até para as cabeças dos que acham que o feminismo morreu ou se tornou obsoleto, assim como acham que todos os "ismos" que buscam algum ideal emancipatório repousam o sono eterno) se não fosse a confirmação daquela frase mais que pessimista: "Nada é tão ruim que não possa piorar"...
A Igreja Católica cometeu mais um de seus absurdos - e o que vimos - Mais violência!
Já não bastasse sua história de inquisições e preconceitos, provou mais uma vez de que lado está no que diz respeito aos Direitos Humanos das Mulheres...
Sinto dizer que cada dia que conheço a Igreja Católica, mais tenho certeza da necessidade de ser feminista e socialista. Na minha infância a palavra excomungada era como um palavrão, algo feio, vergonhoso. Hoje, uma atéia-baiana-batizada, vinda de escola católica, acho que essa excomunhão é, no mínimo, libertadora.
Que as Católicas pelo Direito de Decidir não estejam sozinhas nessa luta interna pelos verdadeiros "princípios cristãos" e que esses profissionais e cidadãos, heróis e heroínas, agora hereges, se orgulhem de cometerem a justa heresia de não condenar uma menina de nove anos, violentada durante toda a sua curta vida, a mais sofrimento ou até à morte - o prêmio maior - a conquista do paraíso...

Boa leitura!
ISa


INSANIDADE, CRUELDADE OU PRINCÍPIOS CRISTÃOS?
Católicas pelo Direito de Decidir manifesta-se sobre o caso da menina pernambucana de nove anos, grávida por estupro de seu próprio padastro

O que pode levar alguém a desejar obrigar uma criança, com risco de sua própria vida, a manter uma gravidez fruto de uma inominável violência? Rígidos princípios religiosos? Ou insanidade e crueldade? Estamos falando do caso ocorrido em Pernambuco da menina de nove anos que apresentou gravidez (de gêmeos!) como resultado de estupros seguidos que sofreu de seu padrasto, violência a que foi submetida desde os seis anos de idade.

A gestação foi interrompida no dia 04 de março último, às 10h da manhã, seguindo o protocolo do Ministério da Saúde que permite abortamento em casos de gravidez de risco ou quando a gestante foi vítima de estupro, ainda que o aborto continue sendo crime no país. O caso da garota pernambucana se enquadrava nos dois casos, já que a gravidez de fetos gêmeos também colocava sua vida em risco, pois a menina pesa apenas 36 kg e mede 1,36 m. Por seu muito pequena, ela não tem estrutura física para suportar a gravidez de um feto, muito menos de dois. É de se imaginar, ainda, os danos psicológicos a que seria submetida se fosse obrigada a levar essa gravidez a termo.

Para nossa surpresa - e indignação!-, entretanto, houve uma intensa movimentação de militantes religiosos contra a interrupção dessa gravidez tão perigosa, sob todos os aspectos, para essa pequena criança de nove anos. Até mesmo ameaça de excomunhão houve! Sob o argumento da defesa da vida, essas pessoas não se importaram em nenhum momento nem com a violência já sofrida por ela, nem com a real possibilidade que havia de a menina perder a própria vida. Se essa criança - que tem existência real e concreta, com uma história de vida, relações pessoais, afetos, sentimentos e pensamentos, enfim -, se essa menina não merece ter sua vida protegida, trata-se de defender a vida de quem? De uma vida em potencial ou um conceito, uma abstração? Quem tem o direito de condenar à morte uma pessoa em nome de se defender uma possibilidade de vida que ainda não se concretizou e não tem existência própria e autônoma?

Pensamos que se configura como pura crueldade essa intransigente defesa de princípios abstratos e de valores absolutos que, quando confrontados com a realidade cotidiana, esvaziam-se de sentido e, principalmente, da compaixão cristã. Seria possível imaginarmos o que Jesus Cristo diria a essa menina? Seria ele intolerante, inflexível e cruel a ponto de dizer a ela que sua vida não tem valor? Ou ele a acolheria gentilmente, procuraria ouvir sua dor e a acalentaria em seu sofrimento? Será que ele defenderia que ela sofresse mais uma violência ou usaria sua voz para gritar contra os abusos que ela sofreu?

Felizmente, a menina pernambucana pôde, graças ao respeito a um direito democraticamente conquistado, diminuir os danos das inúmeras violências que sofreu e a gravidez foi interrompida. Assusta-nos, porém, saber que, ao contrário dessa menina, outras tantas vidas têm sido ceifadas em nome de princípios intransigente, duros, violentos e nada amorosos. Assusta-nos o desprezo pela vida das mulheres. Assusta-nos que suas histórias sejam descartadas, que sua existência na Terra esteja valendo menos do que a crença autoritária de algumas poucas pessoas.

Para que a nossa democracia seja efetiva, as pessoas precisam ter o direito real de escolher. Por isso, defendemos que as políticas públicas de saúde reprodutiva e os direitos reprodutivos já conquistados sejam garantidos. Além disso, lutamos pela legalização do aborto, para que as mulheres que assim desejem, possam levar qualquer gravidez até o fim. Mas que as que não o desejam, não sejam obrigadas a arriscar suas vidas, ou mesmo morram, por se pautarem por valores éticos distintos.

São Paulo, 05 de março de 2009
Católicas pelo Direito de Decidir

http://www.catolicasonline.org.br/cddbr@uol.com.br